SONETO DO ÚLTIMO ADEUS

Tuesday, February 28, 2006

Vou deixar-te em silêncio escuro
dar-te o desdém maciço e puro
vou fazer toda a tua vontade
por pura veemência e caridade.

Que a solidão que tanto cultivas
faça a dor e a paixão sempre vivas
e a tragédia que encenas em vida
fale sempre de adeus e partida.

Se te falta o amor que sonhaste
A mim sobra no ventre o desejo
De viver sem que nada me baste.

Se é melhor só sonhar primaveras
No conforto de viver o medíocre

Serás sempre o que nunca quiseras.

TE AMO DESDE A PRIMEIRA BORBOLETA

Saturday, February 25, 2006

A primeira borboleta apareceu no dia em que Jonas conheceu Camila. Era verde, por isso chamou a atenção do rapaz. A borboleta, não a mulher. Ele estava sentado no banco da praça, como fazia todas as manhãs nos últimos 15 anos, desde que a consciência de sua solidão tornou-se pesada demais. Sentava e cumpria o seu papel de homem velho e solitário; sentia-se fazendo um bem à humanidade desse jeito. Seu avô foi um homem solitário, assim como seu pai e um irmão de sua mãe. Tem-se notícia também de um parente que teve papel importante na corte durante o Império. Todos bons sentadores de banco de praça.

A borboleta, insolente, pousou na ponta do nariz pontudo de Jonas. Aquele borrão verde que atrapalhava a leitura de seu jornal parecia um grilo. Jonas tinha medo de grilos! Um tapa mal calculado gerado por uma afobação desmedida acabou por quebrar-lhe o nariz. E toca pro pronto socorro consertar o nariz pontudo.

"Maldita borboleta verde, quis dar uma de grilo e quem se deu mal fui eu" disse Jonas se dirigindo à borboleta que o seguia até o hospital, como que a escoltá-lo como uma forma de se desculpar.

Saiu do hospital, sempre com sua acompanhante borboleta, com uma tala no nariz e uma saudade enorme de seu banco, pra onde correu sem demora. Ainda faltavam 40 minutos para o meio dia, poderia aproveitar o resto da manhã admirando a sua própria solidão. Mas ao chegar na praça, quase pensou em voltar correndo ao hospital. Faltou-lhe o ar, a pressão caiu, sentiu que ia dessa pra melhor. Enfim, Jonas se apaixonou naquele exato momento. Sentado no seu velho banco estava uma senhora com seus cinqüenta e poucos anos já vividos, o cabelo querendo ficar branco e uma solidão que seria capaz de engolir a de Jonas. Depois de uns cinco minutos de completa pasmaceira (poderiam ter sido quarenta e cinco, pra que serve o tempo nessas horas?) Jonas fez o que era de se esperar de um homem apaixonado: fugiu apavorado e tomou o rumo de casa. Acompanhado de sua borboleta verde, é claro.

Passado o dia e uma noite agitada, Jonas acordou com nova borboleta borboleteando sobre sua cabeça. Agora eram duas a infernizar sua vida, como se não bastasse a senhora solitária que teimava em não sair de sua lembrança. Qual seria o nome dela? O que ela fazia sentada naquele banco? Seria também de uma linhagem de gente sem ninguém? Sentou-se à mesa do café da manhã com suas duas visitas e tomou o seu café preto sem açúcar de todo o dia. Vestiu um abrigo por cima do pijama e correu em direção ao seu banco de praça, na esperança de encontrar de novo a senhora do dia anterior.

Não encontrou. Passou o dia inteiro esperando, mas a mulher não deu as caras. E agora, todos os dias de sua vida, Jonas passa esperando a mulher que tem uma solidão maior que a sua. E a cada dia que passa, uma nova borboletinha verde se soma à comitiva que o acompanha. Pode-se medir sua espera pelo número de bichinhos voando sobre a sua cabeça (são 78 hoje) e pela prostração que apresenta sentadinho em seu banco, fazendo força pra guardar aqueles únicos cinco (ou quarenta e cinco) minutos em que teve seu amor preso no olhar.

SONETO DE UM VAZIO CONSTANTE

Wednesday, February 22, 2006

Pálida cor se faz presente
como um pássaro que voa em prantos
trazendo de longe uma série de cantos
sobre uma dor que já não se sente.

Vejo o amor passar distante
fazendo eco ao me ouvir chamando
um peito oco, o som reverberando
em um vazio que já é constante.

Quero ver-te entrando sorrateira
sorrindo pura e verdadeira
o choro preso morrendo angelical

Vem dar-me a tua alma inteira
E dizer-me, a voz ligeira:
- Te amo como se fosse o final...

OUVE QUEM JÁ CONHECE DO ASSUNTO

Monday, February 20, 2006

Não preciso que me expliques
o curto tempo, o longo beijo
e o fato de eu ter nascido no formato do teu abraço.

Que substantivo traduz o que agora existe?
Tão subjetivo e tão puro na boca
que na meia luz se faz clarão
para que eu ache em ti o meu lugar.

Que adjetivo classifica o momento primeiro?
Aquele que me acordou trazendo ao pensamento
a tua presença, que tomou o novo lar sem resistência.

Que nome eu posso dar ao presente que me deste?
Nova cor na minha aquarela,
com o laranja desenho minha casa.

Fica o verbo pra depois,
se é que um dia ele se fará necessário...
Vem que a pele, a voz, o movimento
contam o que para nós sempre esteve escrito.

É como já disse um profundo conhecedor: "Deixe as palavras à poesia..."

ATÉ DE MANHÃ

Saturday, February 18, 2006

Escrevo aqui correndo
só pra deixar registrado
que só trinta minutos me separam
de passar a noite acordado.

Me espera com o riso solto
e um pouco de curiosidade
que essa noite tudo se transforma
em espírito, força e verdade.

Pra que dormir se eu posso ficar aqui pra te ver acordar?

PRECISO DE TRÊS RESPOSTAS

Thursday, February 16, 2006

Será que cabe na sua mão
um pouquinho da minha
pra não ficar sozinha
nunca, balançando no vento
solta de ocasião,
num caminho bem lento?

Será que existe um lugar
onde o tempo adormece
e tudo o que acontece
dura, transformando em sorriso
o que não sei falar,
o que vem sem aviso?

Será que eu posso beijar
toda a sua presença
que se faz sempre densa
cura, me tirando o que é dela
e no mesmo lugar
me abrir outra janela?

E UM TEXTO SE FEZ DE REPENTE

Saturday, February 11, 2006

Percebeste que esperei chegar o momento
que passei a vida suspenso ao vento
aguardando a chegada do nosso conforto?
Que piada gostosa é a vida
que nos perde em confusa corrida
para depois nos trazer a conhecido porto.

Nas letras o encontro esperado
na pele, o toque adiado
que em breve se faz permitido.
Eu pretendo fazer-te mil poesias
num sorriso trazer-te cores, magias
e o amor que um dia nos foi prometido.

Meu carinho se fez de repente
trouxe aos olhos o que eu via só na mente
fez do silêncio um amigo antigo.
Se me vê tendo os olhos brilhantes
é porque tu fizeste inconstantes
as certezas que trazia comigo.

Não te assustes se me adianto
se te beijo, recém saído do pranto
se te entrego o que não está feito.
O que é o tempo senão formalidade
que nos faz conter a naturalidade
E não diz o que eu trago no peito?

SÓ PRA CONSTAR

Parei pra pensar.
Acontecimento raro
que sempre sai caro
pois na hora em que eu paro
a vida só faz continuar.
Mas pra que polemizar?
Achei pertinente
poder te avisar
que me faço calar
que evito te olhar
pra não ser insistente.
É melhor ser ausente?
Se pareço curado
e do amor refeito
quase um novo sujeito
sem vazio no peito
só pareço errado.
Te agrado calado?
Você foi embora
mas no caminho inverso
me veio o verso
abrigo perverso
de quem perde e chora.
Tudo o que é bom demora?
Num diminutivo
carinho profundo
no sono me afundo
te faço meu mundo
meu sorriso festivo.
Eu não sou bom motivo?
E sozinho te chamo
na vontade de impor
um momento sem dor
e em meio ao torpor
corpo seco, inflamo.
Sabe o quanto te amo?
Eu não posso mentir
e por mais que eu tente
te arrancar na nascente
é só vê-la em mente
que começo a sorrir.
É melhor desistir?
E enquanto te espero
penso em seu rosto amado
milagre desenhado
por artista isolado
de qualquer entrevero.
Descobriu o que eu quero?
Beijos ternos e internos
amor sem perfeição
uma mesma direção
te fazer única estação
e pôr fim aos invernos.
Que tal sermos eternos?

POUCO IMPORTA O NOME DA CANÇÃO

Thursday, February 09, 2006

Foi chorando que Amelie começou a procurar as chaves do carro. Tinha vergonha de chorar, mas a dor parecia diminuir um pouco à medida que as lágrimas iam aumentando. Além disso, a autopiedade começou a fazer um bem inesperado. Sentiu-se bonita, mágica e um tanto etérea em seu pequeno drama pessoal. Só não podia embarcar de cabeça nessa admiração de sua própria figura: o choro tem que continuar.
Começou a revirar as gavetas que ainda guardavam as roupas de Jolie. Sabia que as chaves não poderiam estar ali, mas o desejo de se ver jogando para cima cuecas e meias que ela um dia ajudou a despir parecia incontrolável. Sentiu um prazer ainda maior ao rasgar, quase sem querer, a camisa que Jolie usava na noite da primeira reconciliação. Amelie tinha memória fotográfica.
Decidiu continuar a busca no banheiro. A escova de dente de Jolie já não estava mais ali. Aproveitou a pausa para admirar seu reflexo no espelho: como se achava bonita quando chorava! Era uma pena, se a escova ainda estivesse ali poderia se vingar esfregando as cerdas em suas axilas e virilhas como sempre fazia quando brigavam. Ele nunca percebeu nada, mas a satisfação que sentia Amelie ao ver seu namorado escovando os dentes com tanto asseio, sem saber que na verdade a lambia por tabela, bastava para recuperar qualquer insatisfação que tivesse. Lembrou-se das chaves. Abriu as gavetas embaixo da pia, lotadas de Aspirina. Jolie era um defensor ferrenho das propriedades milagrosas da Aspirina. De impotência à queda de cabelo, um comprimido era a recomendação básica. Para dor de cabeça, tomava Neosaldina.
Na sala, procurou entre os assentos do sofá. Nada das chaves, nem qualquer coisa que a lembrasse daquele filho da puta. Aquele sofá nunca recebeu os dois ao mesmo tempo. A vontade de chorar estava passando. Correu para o som e colocou a faixa número 3 de um CD de Chico Buarque. Aquela música não remetia a nada em específico, mas era uma música bonita, e ela precisava de inspiração. Pressionou o Repeat.
Deitou no tapete ao lado do sofá e se concentrou exclusivamente no choro: as chaves do carro realmente não queriam aparecer. Se aquele puto as guardasse no potinho em cima da lareira, como o combinado, ela não estaria perdendo tanto tempo agora. Entre seus soluços ritmados, pensou como gostaria de transar naquele tapete, de preferência com o irmão de Jolie. Poderia filmar tudinho e mandar pela internet para todos os amigos do casal. Faria questão de gemer bem alto, como nunca havia gemido antes, para que Jolie percebesse o quanto era ruim na cama.De repente, a lembrança. Ela havia saído com o carro pela manhã, a chave deveria estar sobre a mesinha ao lado da porta da sala. Prendeu o choro, como que para guardá-lo para mais tarde. Pegou o casaco que havia ganhado de aniversário de namoro durante a viagem à Santa Catarina e saiu sem fechar a porta. Uma vez no carro, deu partida e saiu cantando pneu em direção à casa de Jolie. No som do carro, a faixa número 3 de um CD de Chico Buarque.

MARIA

Monday, February 06, 2006

Sobre os teus pobres conselhos
e os teus olhos vermelhos
nada tenho a declarar.
Sou mulher de certa idade
e pra mim não é novidade
ver homem me abandonar.

Eu perdi minha juventude
trago fraca a saúde
perdi o pouco que me deram.
Peço que desapareças
passe o ponto, te aborreças
como tantos já fizeram.

Eu não posso ser culpada
só por ser tão desprezada;
do amor, triste farrapo.
Se o povo não sabe nada
e de mim só faz piada,
me tratando como a um trapo.

Não preciso que me lembres
dos tempos não tão recentes
onde tudo era frieza.
Ao meu lado homem parado
coração, feito exilado
longe de qualquer certeza.

Siga logo seu caminho
e abandona o teu ninho
deixa quem te protegeu.
E estando bem distante
não se esqueça, Inconstante,
que minha alma já morreu.

Fico esperando novo tento
que me chega, sempre lento
e que nunca me traz nada.
E na tua ausência ferida
eu me vejo reerguida,
de carinho calejada.

MEU BROTHER CHICO (E COMO AS HISTÓRIAS SE REPETEM)

Sunday, February 05, 2006

"Oh pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar
Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada d emim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos pucos descreve um arco
E evita atracar no cais
Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu
Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi
Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus."
(Chico Buarque)
Oh, pedaço de mim
Pele clara e alívio sem fim
Traz de volta o amor
que eu preciso sentir no peito,
onde a dor, que é som mal feito,
mora e rouba todo o calor.
Oh, pedaço de mim
Minha sorte, meu anjo querubim
Traz logo o meu sorriso
Que eu não tenho mais sentimento
e se eu morro a cada momento
é por seu rejeitar preciso.
Oh, pedaço de mim
Jóia rara, sonho perto do fim
Me devolve o medo
De ser pouco e jamais primeiro;
e de julho até fevereiro
em sua boca virar segredo.
Oh, pedaço de mim
Pesar forte, que me deixa assim
Me acende o desejo
Que a dor apagou fervendo
e a saudade levou correndo
em meio à chinfrim cortejo.
Oh, pedaço de mim
Pensamento que persiste em mim
Traz os beijos teus
Que sumiram no escuro passado
eu te peço pra ser amado
eu te peço pra ser
Por Deus...

 
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