INSPIRAÇÃO PARA UM SONHO

Sunday, December 24, 2006

inspira... expira....
expira... inspira...

E é assim que quero passar minhas noites. Deitado de lado, espelhando a Amada; um negativo cheio de admiração. Sorrateiramente, eu encosto a ponta do meu nariz adunco na pontinha do nariz da Amada, aquele que amassa com tanta facilidade. Prendo a respiração e me preparo como quem vai entrar numa brincadeira de corda.

inspira... expira... inspira... expira...

Já! É nesse momento que eu encho meus pulmões. Recolho todo o ar rejeitado pelos pulmões dela e dele faço a minha atmosfera. Faço de seu hálito o aroma de toda a minha insônia. E numa alternância pontuada em colcheias, consumo sua expiração e alimento sua inspiração, num expira-inspira conjugado. Ela expira, eu inspiro.
E é assim que quero passar minhas noites. Deitado de lado, espelhando a Amada e me alimentando de seus sonhos. E deles sendo alimento...

A TINTA DAS LÁGRIMAS

Sunday, December 17, 2006

Curioso o vazio...
O pensamento
Que ora me vem
É seco e frio.
Se acordo sorrindo
Sem leito que doa
Eu pego no flagra
A minha mão mentindo.
Mas se durmo chorando...
Ah! A tinta das lágrimas
Meus sonhos se fazem
De estrofes dançando.
Meu verso é defunto.
Me falta amar
Amar e sofrer,
Pois já estou sem assunto!

QUE MAIS NA VIDA?

Tuesday, December 05, 2006

- Puta que o pariu!

Nunca uma frase foi tão saboreada em toda a história das verborragias. O Fonseca invadiu a sala soltando...

- Aquela vaca filha da puta!

... todos os pensamentos mais impróprios para o horário comercial em cima da minha mesa no escritório. Eu tentava me concentrar na planilha poltergheist que habitava o meu computador e os meus piores pesadelos nos últimos meses.

- Precisava ser burra assim? Aquela
bitch. Fucking bitch.

Ele adorava xingar em inglês também. Aposto que enquanto eu assistia Vila Sésamo quando criança, ele chegava da escolinha primária e almoçava revendo “
Fuck me Forever – Parte III”.

- Calma Fonseca, o que foi que aconteceu? – eu disse a frase inteira num mesmo tom, quase como um mantra.
- Sabe a Jandira?
- A Jandira?
- É, aquela putinha da cobrança!
- Ah, a Jandira.
- É, a putinha. Bitch. Fucking bitch!
- Sei.
- Pois então, aquela vagaba teve a pachorra de...

Pronto. Pra que ouvir mais, né? Eu estava satisfeito já com o meu vocabulário de palavras sujas. Deixei o Fonseca falando e me transportei pro colo da Jandira. Ah... a Jandira da cobrança... Eu só não largava o emprego naquela firma porque era lá que trabalhava a Jandira da cobrança. Ganhava mal, era mal tratado, odiava o serviço, mas via a Jandira sempre que chegava de manhã e passava pelo corredor. Ela sempre lá, na mesinha dela, afogada em notas e mais notas fiscais.

Jandira não me conhecia além das solicitações de reembolsos enviadas todas as quartas-feiras. Para ela, eu era a assinatura acima do “Nome do Colaborador”, mas pra mim, Jandira era projeto de vida. E daí se eu queria ser escritor? Não importa se eu queria largar aquela planilha pela metade e passar o dia escrevendo e poetando, poetando e escrevendo. Só assumiria a vida de escritor se fosse vida de escritor muito bem pago, que ganhasse milhões e precisasse contratar uma pessoa para cuidar das cobranças. E a vida seria Jandira.

-... na cara dela!

Silêncio...


Acho que o Fonseca secou sua fonte de baboseiras. Melhor. Assim que der, eu falo pra ele:

- “Fica tranqüilo, Fonseca. Logo a vida acaba”.

E eu esperava esse dia pacientemente. O dia em que o mundo ia acabar. Era o anúncio ser feito na televisão pra eu correr em direção à Jandira, me apresentar...

- Oi, sou o João do RH. Vim deitar no seu colo.


E me jogar num mergulho só em direção ao colo dela. Aí o mundo podia mesmo acabar. Não ia mais ter planilha, verborragias, pedidos de reembolso. Só Jandira. Que mais o mundo poderia fazer por mim? Que acabasse de uma vez...

 
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