UM PONTO

Sunday, January 15, 2006

O escuro servindo de escudo; nem assim pôde convencê-la. Digo a você que não sei porque ainda tenta. São seis meses procurando um ponto, mas perdendo-se sempre em três formando reticências. Eu, que já o admirei por sua perseverança, confesso que o tenho achado um tanto quanto patético ultimamente. Uma mosca batendo no vidro, insistindo em passar por onde não há caminho.
O repente foi o mesmo de sempre. Perguntas já respondidas, respostas já engolidas, o carinho censurado entediando o espectador. Beijou como sempre a amou: sozinho. Durante três horas tentou fazer-se amado; tempo demais para quem não consegue existir. Ele podia ver nos olhos dela, sentir em sua respiração ofegante, ouvir na frase mal articulada o quanto ela queria estar ali, embaixo dele, e o quanto queria tê-lo bem longe. Londres. Já foi a cidade da saudade para ela, por que não ser também a cidade do alívio? Ele podia fazer isso por ela. Já havia feito tanto...
Deitada do seu lado, nunca esteve tão longe. Aquela mulher para quem ele implorava o convívio pareceu-lhe qualquer outra que não fosse ela, e a culpa com certeza era dele. O primeiro moço, aquele da surpresa e do beijo no ombro, se perdeu na frustração de um momento perdido. Foram-se os olhos bonitos, a respiração cheirosa, a sobrancelha levantando num convite silencioso. O segundo moço é bem menos persuasivo: do ombro curvado à voz embargada, o silêncio gordo que o acompanha não tem medo de durar. Ficou decepcionado por ter jogado fora tudo o que havia preparado dentro de si mesmo. Ele se comprometera a não viver no ridículo novamente, mas parece que o ridículo procura quem merece.
Novo silêncio gordo. Ele só quer ouvir umas palavras... Espera que a moça sentada de costas pra ele recite a poesia que não achou até hoje. "Deita aqui, passou... O seu amor não precisa mais..." Mais o que? Ele nem lembra mais. Está cansado, muito cansado. Não importa, porque ela não vai dizer mais nada, como sempre. Levanta-se, o dia vai amanhecer. Quer ir embora antes que chegue a luz e ele tenha que se ver patético e digno de pena. Corre até a porta, mas não chega a tempo: o caminho até o carro nunca esteve tão iluminado. Segue olhando para o chão, ouvindo as risadas dos que nunca se perderam por alguém. Que da vergonha se faça o ponto que ele tanto procura. O ponto. Um ponto. Qualquer. Sai sem dizer tchau, porque o adeus há muito já foi dito; aquela história já tinha passado do fim.

1 comments:

Clara Camargo said...

ADOREI ... MUITO MAIS QUE TODOS OS OUTROS... EU ACHO... BEIJOS

 
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