FIM DO DIA

Friday, July 27, 2007

Banhei-me com violência jamais antes utilizada na história da higiene pessoal. A esponja era como uma faca que me escalpelava, retirando todas as camadas de minhas imperfeições. Em lascas finas. Herança maldita, de onde eu vim e do meio em que vivo. Golpeava-me. Forte. Da água, retirava o álcool que esterilizava as minhas feridas, com a esperança de que cicatrizassem tão rapidamente que não haveria como o mal entrar por onde saiu. Foi assim que reduzi-me a pó, para que cada parte de mim pudesse voar o mais longe possível da outra. Como cúmplices que se separam para não serem pegos. Como culpados que se escondem por terem vergonha. Como cacos que, mesmo remendados, já não se sentem úteis. Sequei-me então com o cuidado de uma enfermeira em tempos de guerra, enxugando calmamente cada gota de sangue de um ferimento nascente; não com o objetivo da cura, mas pelo prazer da comprovação do sofrimento. Terminada a lenta alegoria, vi-me nu, desperto, sem nenhuma proteção. Mas também sem nenhuma ameaça.

Hoje eu tirei a vida para escrever.

1 comments:

Rebeca Rezende said...
This comment has been removed by the author.
 
VIVER DE BRISA - by Templates para novo blogger