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Saturday, August 25, 2007

Olha que coisa, Jandira perdeu um dente.
Está constrangidíssima a Jandira. Demais. Ela não entende que o dente é do ladinho, só vê quem fuça o sorriso dela com muita vontade. Ela não entende. Não gosta mais de sorrir, a Jandira. Ela briga com quem conta piada. Fazer cócegas então, nem que não se contenha o atrevimento. Jandira não pode mais rir, segundo sua própria imposição. Ai de quem arrancar um sorriso da minha Jandira! Corre o risco de perder os dentes também.
Não que seja de meu interesse. Se tem uma coisa de que Jandira nunca poderá me culpar é de fazê-la sorrir.

LA FORTUNA ASSISTE GLI STUPIDI

Thursday, August 16, 2007

Calma!
Calma que cala tua alma
Calma que a alma se cala
Não fala da falha que toma
Não soma teu sangue à navalha
Não ralha, não zangue, não talha
A pele que cubra o que valha

VÔO

Wednesday, August 08, 2007

Eu entrei na sala muito nervoso. Era a minha estréia. Eu nunca havia antes assistido o nascimento de um futuro brilhante.
Sentei no lugar guardado pelo meu próprio nome. Meu nome. Eu tinha um lugar naquela sala. Ao pensar nisso, sorri pela primeira vez naquela noite.
No palco, um casulo é revelado pela luz. Nele, ainda oculto, minha borboleta era adivinhada por todos os presentes. Não era nenhuma proeza de nossa parte, era naquele casulo que caia o único facho de luz em quilômetros. Ela não poderia estar em qualquer outro lugar. E só dela poderia sair tanta luz.
Com o rompimento do casulo, ouço a primeira rufada de sangue tingindo as paredes de vermelho. Não seria a única. E não era qualquer vermelho. Era o vermelho que toma conta dos olhos depois do choro e da face antes do amor. Minha borboleta também previa o futuro, olhem só! E do casulo surgiu, indecorosa, minha poetisa-borboleta e sua verborragia inebriante. Sorri pela segunda vez, enquanto a escutava; senti-me em casa novamente.
Mais sangue na parede. Aquela platéia não se dava conta, mas estava assistindo a um duelo. Minha borboleta voava como a pequena gladiadora que é, escalpelando com sua espadinha de luz todas as camadas de pele calejada que recobria nossos sentidos. Cortava e cortava até o sangue espirrar; nítida prova de ter alcançado a última camada de nossas peles. Única amostra de que nossos corações ainda batiam.
Quando todos já choravam de dor e clamavam por clemência, minha borboleta guardou sua espada. Dedicou-se então ao tratamento dos feridos. Pousava de coração em coração, pingando de suas lágrimas sinceras em nossas veias, diluindo todo esse sangue espesso e escuro que ainda nos restava. Precisávamos ser leves para compreendê-la.
Foi então que me perdi completamente. Suas lágrimas em minhas veias tiveram o poder de me retirar da realidade, me elevar aos céus da criatividade e eu também me vi borboletando. Ah, minhas asas... Queria que tivessem visto minhas asas. Mas exaustos pela batalha, incautos por natureza, a platéia não se deu conta do que acontecia.
Só acordei com o que pensei serem os aplausos. Levantei-me para me juntar ao coro dos resgatados, mas só para descobrir que não eram aplausos que eu escutava e também não era o choro que me escondia as feições. Na verdade, chovia torrencialmente.
Descobri-me ao ar livre; minha borboleta tinha aprontado mais uma das suas. O teto da sala desaparecera. Não sei se arrancado, não sei se fugido. Aposto que saiu calmamente, abrindo espaço para que as idéias de minha borboleta pudessem rodopiar. Olhei para o céu na mesma hora, era ali que estava o verdadeiro espetáculo que ela havia nos preparado.
Voltei minhas atenções para dentro da sala quando os verdadeiros aplausos quebraram o silêncio do escuro. Surpreendeu-me a inversão de papéis que se seguiu. Não era a minha borboleta que se curvava em sinal de agradecimento. Era a platéia que estava curvada em uma postura de adoração. Minha borboleta sorriu para mim, que a admirava inconteste. Eu sorri de volta, e pela última vez naquela noite, simplesmente porque ela havia me salvado.Foi com esse sorriso na cara que ela partiu. E foi o mesmo sorriso que eu a entreguei que se viu banhado novamente. Agora não era mais a chuva, eram minhas lágrimas. Não eram lágrimas de despedida. Eram lágrimas antecipadas do nosso reencontro, banhando a certeza de que eu também sabia voar.

PUTA COMO A PRÓPRIA FÉ

Wednesday, August 01, 2007

Falava-me tanto das próprias virtudes
Que nossas conversas tinham-me o peso da prece
E eu, perdido em meus desejos rudes
Escutava-a, como se despindo-a não estivesse.

Deitada, em seu descanso bovino
Limpava o sexo com lenços de nariz
Depois de usá-lo com esforço ferino.
- Dizia-se casta, minha crente meretriz.

Já escrevi-lhe um soneto de amor
Que ela até hoje recita à voz rouca
De tanto gemer com quem for.

Ajoelhada, reza nua e louca
E se não fala a deus em louvor
É pelo falo que cala sua boca.

 
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