PARA ONDE VÃO AS ROSAS?

Tuesday, January 29, 2008

Secou-me a roseira
Morreu de abandono
Embarcou num sono
De morte inteira
Não ousei tocá-la
Que descanse plena
Na pausa serena
Que agora a embala
Ficou muito rasa
A minha existência
Tomei desistência
Mudei-me de casa
Fingi desapego
Nem missa rezei
Menti, simulei
Um grande sossego
Nem vi quando a rosa
Ao ter-me a partir
Botou-se a sorrir
Toda indecorosa
“- Se partes, te curro,
Pra mim não há volta”
E a rosa em revolta
Virou-me um sussurro.

TRAGA

Sunday, January 20, 2008

Trocou suas unhas pelo cigarro do marido. Tanto roía as unhas Dona Judith que chegava o sabão a doer na hora do banho. Não bastasse o dedo doído por si só, a cabeça também começou a coçar por falta de uma lavagem eficiente. Somados os reveses, achou por bem trocar de vício.
Tem pavor do cheiro de cigarro a Dona Judith. Do cheiro, mas não do gosto. Descobriu que chupando o cigarro apagado, vinha o gostinho queimado do beijo do marido Seu José. Era como voltar à mocidade macia de outros tempos, em que o difícil era conter o beijo inquieto de Seu José, jovem ainda e sem a alcunha de Seu. Agora, Dona Judith cultiva uma língua solitária, fadada ao consolo de um gostinho.
Mesmo avançado na idade, o marido de Dona Judith dava suas caminhadas noturnas. Saía perfumado, com o cabelo e o colarinho igualmente engomados e um cravo estrelado no peito. As horas passavam e Seu José voltava ao lar pouco antes do Sol revelador nascer. Entrava pé enrugado ante pé enrugado, pensando-se oculto no escuro da sala. Mas Dona Judith, sentada no sofá, chupando seu cigarrinho, reconhecia o marido. Mesmo com os cabelos desgrenhados, o colarinho sujo de batom e o perfume misturado, Dona Judith reconhecia o marido e pensava em que canto desse mundo tinha ido parar o cravo do peito marital dessa vez.
“De que adianta tanta goma no cabelo?” – e Dona Judith suspirava o seu cigarrinho, soltando uma baforada muda de fadiga.

NU

Monday, January 14, 2008

Peco às pencas ultimamente
Calo a fala de ternura
Com a fome de sujeira.
Penso que essa festa me é recente
Me vem de um pós vida-dura
E um pré pra-vida-inteira.
De que servem modos e canduras
Se a glória verdadeira
Só se entrega ao descrente?
Tragam-me as gazes e ataduras!
Nessa orgia de primeira
Sangro a minh’alma indecente.
Sinto que essa febre é passageira
E que o gozo inconseqüente
(Injustiça!) pouco dura
Faça, então, minha pele corriqueira;
Leve, mesmo penitente,
Nas lambidas da Fartura.

 
VIVER DE BRISA - by Templates para novo blogger